Irmão Mor

 


 

 

Ele olhava o vale, o vale das sombras que se perdia no limiar do horizonte. De perto ele parecia ainda maior, seus braços pareciam de fogo tal a luz que irradiavam nas extremidades de seus dedos. Poderia comparar a uma fênix em chamas, que ofuscava mesmo a fogueira de chama tênue que ele sempre acendia quando estava na montanha.

- Veja, - disse ele apontando para o vale. – muitos se detêm  no vale porque não perdoaram a si mesmos, não conseguem olhar para cima e ver a liberdade, não conseguem perceber que a própria mente os aprisionam, que os carrascos que os flagelam são eles mesmos os criadores, tudo porque estão presos aos grilhões da culpa.

             A Lei do Perdão é igual à Lei do Amor, o mesmo remédio que serve para os outros, serve para si. Para perdoar o próximo é preciso aprender antes de tudo perdoar a si mesmo. Não se culpe não se puna mais por erros do passado. A culpa não leva ninguém a remição, e sim o trabalho na regeneração. Não pode pedir a ninguém que perdoe, se vós mesmos não se perdoais.

            É preciso reunir todas as partes e reconstruir.

            Olhei para ele apavorada, me sentindo uma avestruz pronta a buscar um buraco para esconder a cabeça. – Vejo portas que são espelhos em torno de mim, e nestes espelhos vejo imagens, nos espelhos vejo o meu próprio reflexo em outros tempos, outras vidas e lugares. Sinto meu coração acelerar e a mente turvar e cegar meus olhos. Sinto um choque como se algo batesse em mim e escuto um estrondo e barulho de estilhaços.

- O navio só ancora em porto pacificado. Para que ele aporte é preciso antes construir um cais. O cais é a segurança, é aquele que traz firmeza, os buscadores desta era estão a deriva, perdidos pelo encanto do canto das sereias. Este “canto” os fazem volver em círculos, revêem o que viram como algo novo, insólito que não é verdade, porque já viram ou participaram inúmeras vezes em seus regressos a Terra. Mas eles precisam de um cais, de vislumbrarem um porto pacificado porque estão cansados mesmo sem a consciência de andarem em círculos. 

            Obliterar o passado e abjurar as vivências, é renegar as lições, e as experiências do caminho. Quando se colhe uma rosa, será apenas uma vez, mesmo que venha  colher centenas de rosas, como aquela será única. Assim são as experiências na matéria, cada oportunidade tem suas nuances próprias, textura, perfume. A oportunidade de vivenciar a mesma situação com alguém, pode demorar centenas de anos, e isso significa estacionar, não progredir. Porque aquele que vivenciou a situação com você, ele resolveu a pendência ele segue o caminho dele, seguindo suas construções evolutivas, seus degraus. A volta dele para resolver um entrave só se dará em dado momento por compaixão, e pode demorar. Quando o Governador Planetário pediu que se reconciliasse com o irmão de caminhada antes a tudo, Ele queria dizer: Não darás só um passo enquanto estiver preso a dividas.

             Os últimos trabalhadores têm o tempo escasso, precisam acelerar o processo das construções internas, entendendo como ocorre a estrutura da “torre”, pois elevar-se sem alicerce sólido e construir castelos em bases movediças. – Ele deu uma pausa e olhou-me no fundo dos olhos perguntando. – Qual nome deseja que eu a chame rosa?

- Já o chamou não, de Rosa? – Sorri.

- Entre as rosas e o jardineiro há uma integração absoluta, uma unicidade. Ele sabe das necessidades das rosas, e elas correspondem apurando o perfume, as matizes, a textura. As flores são para os jardineiros a oportunidade na evolução, o pequeno ato em cuidar da Obra Divina, é um testemunho de amor. O amor não é singular, assim como o Amor de Deus.

- Eu não sei como vou cuidar das “rosas” que fui. – Disse olhando o chão cheio de cacos do espelho.

- As rosas que foi Rosa, fazem parte de você, a rosa carente, a rebelde, a amarga, a traidora, a sensível, a amiga, a mãe, a amante, a prostituta. Todas as rosas são personalidades que construiu por milênios, que um dia irão congregar tornando uma só, absoluta.  – Ele num gesto ergueu os cacos e o fogo que saia de suas mãos fez envolver os fragmentos do espelho até liquefazer, e fundisse. E  os cacos formaram um cristalzinho de luz, ele direcionou a altura do meu coração. – Você sabe onde o processo alquímico ocorre, essa usina é capaz de transformar o lodo em ouro. Quebrantando o ódio, dissolvendo a raiva, adoçando a amargura.

             A Terra está saturada da energia destrutiva que precisa passar por essa depuração, para inibir seu efeito nas criaturas menos vigilantes.

            As lições dos livros necessitam de exercícios repetitivos, não adianta ler sem copilá-los para o caderno da existência e aplicá-los na vida diária, pois assim eles não farão parte da experiência. Mas saiba que a repetência após a queda não é punição e sim oportunidade de fazer novamente, e fazer melhor!

            O Mestre não veio a Terra para ficar sentado em seu apogeu passando ensinamentos, Ele foi vivenciá-los junto com seus discípulos e seguidores. A palavra instrui, mas só o exemplo arrasta multidões. Não adianta palavras se elas não descerem ao coração, e no coração tocadas pelo amor se tornarem atitudes. Palavras secas tende a cair no esquecimento, só o exemplo poderá manter o viço, porque é água viva. 

            Não menospreze os corpos que animou em várias personalidades, não esqueça que teve o empréstimo dos elementos orgânicos e plasmáticos da Mãe natureza para dar vida a ele. Muitos deixaram de vir a vestir as vestes carnais para que viesse e progredisse, então agradeça a oportunidade, não desdenhando do que foi. Porque é hoje espiritualmente, moralmente esse  resultado do que vivenciou em outras vidas, cada “rosa” foi um espinho desencravado, um defeito moral do Espírito no qual precisava ser extirpado, a dor e o sofrimento foram conseqüências de atitudes equivocadas. Não há meios de curar a ferida, sem expulsar as impurezas, sem assepsia, é dolorido, mas após vem o alívio, a leveza.

- Suas mensagens estão diferente Irmão Mor. Você também está Srª.Rosa, mas ainda não aprendeu que nada no Universo é estático? Mesmo seu corpo parado, a mente está em movimento criando e recriando, mesmo que não tenha a lembrança clara, esteve sempre aprendendo. Como lhe dissemos em outra oportunidade, um tombo é aprendizado e , um exercício, manter-se erguido uma prática diária, repeti-los para que não esqueça é disciplina. E diante da disciplina voltamos à vontade, tudo no Universo depende dela para transformar, dar movimento.

            Os questionamentos são necessários, expor as dúvidas, a disposição de estar junto na caminhada aprendendo uns com outros. Muitos que estão buscando se encontram perdidos e desconhecem a própria sensibilidade no qual interagem com o “invisível”. Todo trabalho sério de pessoas idôneas que venham esclarecer, colocar parâmetro nesta busca, é laudável.

            Essa interação é multifacetado, se o individuo não ter um certo conhecimento será um joguete das auto sugestões alheias ao seu psique, como as próprias criado por si mesmo.

            O ângulo que nós vemos o vale abaixo de nós é um, se trocarmos de posição veremos o mesmo vale de outro ângulo totalmente diferente e será o mesmo vale.

- Eu compreendo o que quer dizer. – Andei um pouco me afastando do local. – Até a percepção que tenho da luz tem um outro foco. – Arrematei.

- No plano extrafísico onde a manipulação de recursos ectoplasmáticos e projeções para aquele que não tenha uma boa percepção seja facilmente manipulado. Mesmo os que têm  uma boa visão do dos planos rarefeitos, precisam orar e vigiar sempre, porque os ataques serão maiores para que este caia e seja igual submetido e serviente.

            O tempo passa tão rápido, era hora de se despedir.

 

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